sexta-feira, outubro 19, 2007

Daniil Harms

Para mim a grande descoberta literária dos últimos tempos (dos meus tempos...que os dele, já lá vão), talvez até dos últimos anos foi Daniil Harms, que conheci através do livro A Velha e Outras Histórias, publicada pela Assírio e Alvim. Em resumo, foi um vanguardista russo, de seu nome Даниил Иванович Ювачёв (Daniil Ivánovitch Iuvatchov) e de pseudónimo Daniil Harms, Daniil Kharms ou ainda Daniil Charms, que nasceu em S. Petersburgo no Inverno de 1905, e morreu à fome na prisão da mesma cidade(rodeada pelos Nazis) no Inverno de 1942. Pelo meio parece que escreveu umas coisas... e que sensação brutal me transmitiram essas "coisas" ao lê-las nos últimos tempos. Basicamente são pequenos contos, cheios de absurdo e humor negro... recomendo mais que vivamente. Recomendo MUITO! :)




Aqui ficam dois pequenos exemplos deste mestre:

"SINFONIA Nº2
Anton Mikhailovich escarrou, fez «ah», voltou a escarrar, fez outra vez «ah» e foi-se embora. Tanto pior para ele! Vou antes falar de Ilia Pavlovich.
Ilia Pavlovich nasceu em 1893, em Constantinopla. Pequeno ainda, levaram-no para S. Petersburgo, onde concluiu estudos na escola alemã da rua Kirochnaia. Depois trabalhou numa loja, depois fez outra coisa qualquer, e quando começou a revolução emigrou para o estrangeiro. Olhem, tanto pior para ele! Vou antes falar de Anna Ignatieva.
Mas falar de Anna Ignatieva não é assim tão simples. Começa por que não sei nada dela, e depois acabo de cair da cadeira e esqueci tudo quanto tinha para contar. Vou antes falar de mim.
Sou alto, não sou nada parvo, visto com elegância e gosto, não bebo, não vou às corridas mas tenho um fraco por mulheres. E as mulheres não fogem de mim. Gostam mesmo que dê passeios com elas. Serafina Izmailovna convidou-me mais do que uma vez para ir a casa dela, e Zinaida Iakolevna também costumava afirmar que tinha muito prazer em ver-me. Com Marina Petrovna é que se passou uma coisa divertida, que desejo contar. Uma coisa banalíssima mas ainda assim divertida. Marina Petrovna ficou completamente careca por minha causa, careca como um ovo. O facto deu-se desta forma: um dia fui a casa de Marina Petrovna, e ela «zás!», completamente careca. Só isto."


"CADERNO AZUL Nº 10
Era uma vez um homem ruivo, sem olhos nem orelhas. Também não tinha cabelos, e só por convenção lhe chamávamos ruivo.
Não podia falar porque não tinha boca. E nariz também não.
Nem sequer tinha braços e pernas. Também não tinha barriga, nem coluna vertebral, nem mesmo entranhas. Não tinha coisa nenhuma! Por isso pergunto de quem estamos nós a falar.
Desta forma é preferível nada acrescentarmos a seu respeito."

1 comentário:

Barba Rija disse...

Meu caro, isso é genial.