segunda-feira, abril 03, 2006

Baco

É verdade o que dizes, mas não deixo de sentir uma formatação ainda esgalhada, forçada. Queres a toda a força ser totalmente honesto mas não consegues. A verdade é dor, e o dom dos pais é nos ensinarem a mentir. O que é a linguagem senão uma forma de afastar as pessoas? De criar uma forma de guerra? Passo a vida entre um escritório, uma residência de estudantes e uma casa de idosos, e não deixo de reparar... (aqui pensei: farei um trocadilho com a palavra "reparar"? Decidi que não, decidi fazer antes um parêntesis à moda do Antunes, e em boa verdade decidi mas é gozar com o leitor que agora por azar lê precisamente estas palavras que escrevo agora. Será que é assim que se prende o leitor? Sentes-te preso? Já me mandaste à merda não sem desprezo? Ainda não? Queres ver onde vou chegar... )

Ou apenas ver. Como é a Forma. deste texto?

Anaaalisa-o. Distorce-o. Diz que é feio, que é lindo, como se isso interessasse às palavras que lês. Não vês que elas são cegas à tua presença? Ou será que és cego? "A arte é uma mentira" lá dizia o Picasso e ninguém o entendia (...Confesso, estou bêbado, bêbado como o Baco. Mas não de vinho. Nem de almôndegas. Da vida, mas não da realidade. Da TV, da Arte, dos anúncios belos e cheios de curvas, como todos os objectos à nossa volta foram desenhados para serem os mais sexys, os mais desejáveis. Nem consigo repugnar! É tudo demasiado Belo! Enchem-nos os sentidos até ao esófago e exigem-nos criatividade, não me admira que todos os meus colegas pareçam regurgitar o seu trabalho.

(aqui perdi um pouco a minha sinceridade. Ali em cima pareceu-me mais giro, mais belo.

Belos parêntesis, vejam bem, como a arte é. Nem sequer fechei o anterior para criar uma suspensão na respiração do leitor. Agora não sabes se ele acabou ou não. Usa todas as armas para interessar o leitor, dar-lhe! uma! experiência estética!

Pois pois... Freud delirante é o que chamo ao mundo, eu o velho do restelo... eu eu. Eu?Sim eu. Digo mal pois digo, não é por acaso que escolhi ser do FCP, pois irritavam-me todos esses seres benfiquistas que diziam "ganhámos ganhámos", quando no fundo apenas ganharam uma cara de aparvalhados ao mesmo tempo que perderam o dinheiro das suas quotas e bilhetes. Ridículo? Mas o que andamos aqui a fazer? (é. aqui perdeu-se a linearidade textual, onde se denota demasiada vaidade para tão mau gosto) Gastar pilhas em videojogos "reais"? A vida é um flirt? (...ui ui, isto tá a piorar! Agora entrámos nos lugares-comuns...) Mas que merda! Deixem-me em paz! Parem de analisar! Digam coisas! (ah, bem feito bem colocado. boa passagem de elementos retóricos reais para um mais surrealista, uma passagem de profundidades). Será possível ainda dizer alguma coisa? (mas que harmonia de elementos! Repare-se como o autor mistura dois tempos, criação e crítica num único espaço, desconstruíndo-os, agora entende-se onde o autor queria chegar! Brilhante!)

- Ah mas eu não sou de tal opinião. Isto de ter um escritor que faz de criador e crítico da sua própria obra parece-me mais um sintoma de grandiosidade misturado com autismo grave.
- Capaz... mas lembra-te que também nós não passamos de pensamentos do mesmo.
- E daí? Devo homenageá-lo por isso, não? Ainda por cima tem falta de imaginação e tenta enganar os seus amigos com um pretensiosismo destes! Cá uma lata!.... e não pára!
- Pois é. Já farta.

Farto.
Sinto-me anestesiado por tanta beleza,
farto de tanta estética.
farto de tanto espelho mágico.
Farto da palavra.
e do verbo.

Anesteticizado.

...
Yo ho ho and a bottle of rum!

2 comentários:

Fartura disse...

e em que moldes defendes então a libertação do ideial estético que nos vão incutindo desde criança?


como almejas modificar o mundo sem gritares o q te vai na alma? sem criares pontes de mutua compreensão e partilhares a tua visão do q nos rodeia? julgas que por chocares, provocares e levares ao limite o indesejado leitor consegues atingir o teu objectivo? muitos já seguiram a tua estratégia.. (alguns por dinheiro, outros por ideias... outros por pura e simples estupidez)

a verdade é q a formatação é de tal forma que nos tornamos tb imunes a esse tipo de provocação... ñ é pelo mau horrivel que consegues ascender ao bello sublime....

penso eu de que...

(posso nem sempre concordar ctg...mas neste caso até

Barba Rija disse...

gritos criam ruído.
compreensão cria estagnação.
choque provoca dores.
esses muitos de que falas, a "repetição", essa causa fadiga.

Porque haveria eu de querer subir ao sublime se ele me bate à porta todos os dias e o ignoro constantemente?

Mais fácil é ligar à corrupção da nossa mente como um processo inexorável. Chegarmos à ternura dos quarenta e dizer "bem... eu bem tentei... vejam como a poesia que escrevi o ATESTA, o DOCUMENTA."

De que vale o grito constante de que falas, se estamos surdos às respostas? Há uma palavra que define tais pessoas: os beatos.

Olha, eu simplesmente sou cego. Estou na caverna de Platão. Não me reconheço ao espelho, vejo sempre um estranho. Surgem-me frequentemente as perguntas, Quem sou eu? Quem és tu? O que se faz por aqui? (joga-se às cartas?)

Provavelmente anda-se a discutir barbaridades pseudo-filosóficas sem fim.

1 abraço!