quarta-feira, dezembro 22, 2004

1984

... e as arrumações continuam LOL

Agora um excerto que eu cuidadosamente guardei de um livro terrífico, da autoria de George Orwell. É o clímax do livro. Winston está a ser interrogado pelo "Partido" por O'Brien, num processo de cura.

O'Brien "-...O passado existe concretamente, no espaço? Existe algures um lugar, um mundo de objectos sólidos, onde o passado esteja ainda a acontecer?
Winston "- Não.
"- Então onde é que o passado existe, se é que existe?
"- Nos arquivos. Está registado, por escrito.
"- Nos arquivos. E mais?
"- Na memória. Na memória dos homens.
"- Na memória. Ora muito bem. Nós, o Partido, controlamos todos os arquivos e controlamos todas as memórias. Portanto controlamos o passado, ou não?
"- Mas como é que podem impedir as pessoas de se lembrarem das coisas! - exclamou Winston (...) - isso não depende da vontade. É exterior a nós próprios. Como é que se pode controlar a memória? Vocês não controlaram a minha!
O'Brien voltou aos seus modos ríspidos(...)
"- Enganas-te - disse - quem não a controlou foste tu. E foi isso que te trouxe até aqui. Estás aqui porque te falta humildade, auto-disciplina. Nunca quiseste aceitar o acto de submissão, que é o preço da saúde mental. Preferiste ser louco, uma minoria de um só. Apenas a mente disciplinada granjeia a realidade, Winston. Julgas que a realidade é uma coisa objectiva, externa, que existe por si própria. Julgas também que a natureza da realidade é evidente. Quando, numa das tuas alucinações, visionas alguma coisa, é exterior. A realidade existe no espírito humano, e em mais parte nenhuma. Não no espírito individual, que pode cometer erros, e que para todos os efeitos é perecível: só existe no espírito do Partido, colectivo e imortal. O que o Partido consagrar como verdade, é verdade. Impossível ver a realidade excepto através dos olhos do Partido. É isso que tens de reaprender, Winston(...).
"- Lembras-te - prosseguiu - de escreveres no teu diário que «Liberdade é a liberdade de dizer que dois e dois são quatro»?
"- Lembro-me - confirmou Winston.
"O'Brien ergueu a mão esquerda, com a palma voltada para si, o polegar escondido e os outros quatro dedos esticados.
"- Quantos dedos tenho aqui, Winston?
"- Quatro.
"- E se o Partido disser que não são quatro mas cinco, quantos são?»

In ORWELL, George, "Mil novecentos e oitenta e quatro"; 4ª edição, Antígona, pp. 249-250

1 comentário:

Fartura disse...

GENIAL!!!!!!!

era mesmo isso que eu queria dizer... a verdade por si só não existe, é algo transitório, e integrado numa época social e histórica. qm define a realidade são os homens, ñ a verdade, esta é uma simples projecção dos desejos mais intimos de alguns homens. a verdade é q é impossivel almejar uma coisa que objectivamente não sabemos se existe ou não... apenas podemos especular....