Navego pela blogosfera, esse mar sem fim de nulidades e tentativas de confissões falhadas do quotidiano, mesclado com um sem fim de aforismos intelectuais, românticos ou atávicos e maravilho-me pela descrição perfeita que me reconstrói a imagem de portugal, virtual. Um portugal instantâneo, com acesso directo ao Pacheco Pereira ou a barrigas de arquitectos, blasfémias ou indiferentes, óbvios e descarados, tímidos, circunspectos. Uma distância de nada recria um espaço público há muito vendido na feira da ladra aos centros comerciais privados. Lindo, e no entanto, vazio.
Não mais o contacto da carne. Poderia contar pelos meus dedos da mão o número de palavras que ouço durante um dia inteiro fechado num atelier, onde o fervor do teclado ultrapassa o som da rádio. Coisas inesquecíveis acontecem. Na semana passada, o meu colega do lado informou-nos a todos que se fosse necessário, podíamos telefonar-lhe ou mandar-lhe um e-mail a pedir ajuda durante as suas férias. Seria a coisa mais normal do mundo, não tivesse sido a mensagem mandada por e-mail! (Quando lhe agradeci em voz bem alta e colocada, o riso foi geral)
Não mais o apego à realidade. No virtual, tudo é possível, não existem limites físicos que se impõem, o próprio tempo aparenta desaparecer com a sua homogeneização. O sonho de Platão. Cubos, cubículos. Rectas. A perfeição do relógio, da máquina. O nosso pesadelo.
E é neste pesadelo que a blogosfera tenta emendar o espírito humano, dar-lhe côr, expressão. Promete-lhe a publicação de todos os medos e fobias, a expulsão dos fantasmas pessoais, uma espécie de mescla entre um copioso divã psicológico, onde gritamos, e uma democratização do serviço público da informação / opinião. O mais interessante é que não há fronteira entre os dois. Misturam-se e a informação deixa de o ser, passa a ser texto contexto. Passa a ser ficção. Com uma barra de confiança em cada um, escolhemos quem bem quisermos, e mergulhamos na história virtual mais excitante.
Não passam de escapismos. Todos os estilismos não passam disso mesmo. A beleza da forma é apenas uma musa que não serve de nada sem conteúdo real. Nesses momentos, assombra-me a penumbra do poço profundo que se abre, mostrando-me o seu vazio. Quando olho demasiado para o vazio, ele olha-me de volta. E arrepio. Desligo tudo à minha volta e tomo outro café. Afinal de contas, melhor ser um terramoto humano que uma lapa.
Pouso a chávena de café na mão, olho à minha volta e penso. Acabaram-se as férias, e o olhar das pessoas retorna à penumbra, acabando os sonhos construídos de anúncios colgate e óculos Ray Ban.
Logo sinto a cafeína a subir, e penso, o que vale é que a Champions está de volta.
Falávamos de quê?
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